quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

AS MODAS LUCRATIVAS PARA INDÚSTRIASFARMACÊUTICAS E MÉDICOS, E A REVISTA VEJA

Matéria de Cynara Meneses, no Socialista Morena

A farra bilionária das estatinas e o “jornalismo” subserviente à indústria farmacêutica

vejaestatinas
(Capa da revista Veja em 16 de junho de 2004)
Eu estava trabalhando na revista Veja (os piores oito meses de minha carreira; leiaaqui) quando saiu uma capa louvando as estatinas, pílulas usadas para controlar o colesterol “ruim” que, afirmava a revista, eram “a grande surpresa da medicina”, “a aspirina do século 21″, “um dos medicamentos que mudaram a história”. A reportagem, de cinco páginas, parecia um anúncio pago pelos fabricantes do medicamento, comparado por Veja à descoberta da penicilina. As estatinas seriam eficazes para tratar angina, Alzheimer, osteoporose, câncer, esclerose múltipla e diabetes (íntegra aqui). Só faltou bicho-do-pé. “Um belíssimo negócio para a indústria farmacêutica”, vibrava a semanal da editora Abril.
De lá para cá, as estatinas se transformaram na maior fonte de lucro dos laboratórios. Uma delas, o Lípitor (atorvastatina, da Pfizer), se tornou o medicamento campeão de vendas no mundo e, com o providencial pontapé da “revista mais vendida”, o número dos que usam estatinas no Brasil pulou de 400 mil para 8 milhões de pessoas. Mas o que pouca gente sabe é que, após 10 anos, o que foi apresentado ao leitor incauto da revista como panacéia agora é questionado por pesquisadores, médicos e cientistas como prejudicial à saúde e, no mínimo, inútil. E o mais bizarro: hoje o uso contínuo de estatinas está associado a alguns dos males que supostamente curaria, como perda de memória, doenças cardíacas, diabetes, fraqueza muscular e câncer.
Dois anos atrás, a própria Veja reconheceu, em uma reportagem minúscula escondida no site da revista: “Acaba a lua-de-mel com as estatinas” (leia aqui). No texto, a publicação admitia que efeitos colaterais graves têm sido associados ao uso do remédio outrora “revolucionário”, até mesmo a capacidade de provocar o infarto em vez de preveni-lo –justamente a maior qualidade levantada pela propaganda, ops, reportagem anterior. Novos estudos com voluntários, advertia o artigo, comprovam que “usuários frequentes das estatinas tiveram um aumento muito maior na calcificação de placas em suas artérias coronárias. Isso poderia levar a riscos maiores de infartos nesses pacientes”.
Na época da capa-louvação, o cardiologista Sergio Vaisman, coordenador da pós-graduação em Medicina Preventiva da Universidade Fernando Pessoa, no Porto, escreveu um artigo em seu blog em que condenava o excesso de otimismo da Veja em relação às estatinas. “Acho lamentável assistir a esse desfile de propaganda que enaltece produtos que irão comprometer nossa saúde se usados em demasia”, escreveu Vaisman, criticando a falta de interesse da revista em mostrar os efeitos colaterais do remédio, como as dores musculares crônicas e a rabdomiólise, uma degeneração das fibras musculares que pode levar a lesões renais graves e até à morte. Detalhe: uma estatina, a Baycol (cerivastina, da Bayer), já havia sido retirada do mercado em 2001 por causar rabdomiólise e matar 52 pessoas nos EUA por falência renal.
Entrevistei Vaisman pelo telefone. Ele está cada vez mais cético em relação às estatinas, que só prescreve a seus pacientes em casos muito graves e por um período apenas. “Sou contra o uso contínuo de estatinas, mas vou contra a corrente, porque o establishment da medicina manda fazer isso. Existe uma pressão muito grande da indústria farmacêutica, principalmente sobre os médicos recém-formados”, diz. E ressalta: “Não existe nenhuma evidência científica de que as estatinas protegem o coração de um infarto”.
time
(As mudanças em relação à gordura ao longo dos anos)
Outro aspecto que mudou neste meio tempo foi a própria visão da ciência (não da indústria farmacêutica) sobre o “colesterol ruim” (LDL), antes o grande inimigo do homem moderno e razão de existir das estatinas. “Hoje o colesterol não é o vilão que se pensava. É considerado, por exemplo, fundamental para a produção dos hormônios sexuais. Claro que tudo em excesso é ruim, mas o colesterol tem papéis benéficos”, defende Vaisman. O colesterol também é necessário para o bom funcionamento dos intestinos e do cérebro.
Em outubro de 2013, a Sociedade Brasileira de Cardiologia causou polêmica ao rebaixar o limite considerado saudável de colesterol “ruim” de 100 miligramas por decilitro de sangue para 70 miligramas por decilitro, o que fez aumentar ainda mais as prescrições das estatinas nos consultórios médicos. Na época, especialistas contrários à medicalização excessiva chamaram a atenção para os efeitos colaterais da droga, sem sucesso. Como disse Vaisman, o establishment da medicina no Brasil abraçou as estatinas sem restrições. E o pseudo jornalismo de “saúde” praticado por alguns veículos foi junto.
Nos EUA e na Inglaterra, grandes consumidores das estatinas, a rejeição ao medicamento vem crescendo. O norte-americano Raymond Francis, químico formado pelo MIT (Massachusetts Institute of Tecnology) que se dedica a pesquisas sobre qualidade de vida, contesta, inclusive, que o colesterol seja mesmo responsável pelos problemas cardíacos. “O colesterol não causa doenças do coração”, afirma. “Os franceses têm a mais alta taxa de colesterol da Europa, ao redor de 250, mas as menores incidências de doenças do coração e metade dos ataques cardíacos dos Estados Unidos. Na ilha de Creta, berço da saudável dieta mediterrânea, um estudo de 10 anos falhou ao não conseguir encontrar um só ataque cardíaco, apesar das taxas de colesterol acima de 200″ (leia mais aqui). Outros estudos recentes dizem o mesmo: colesterol alto não é sinônimo de risco para o coração.
Raymond Francis publicou um vídeo no youtube onde diz com todas as letras: “Estatinas são veneno. Não previnem doenças do coração e não são seguras. Pelo contrário, há um aumento dos infartos entre as pessoas que usam estatinas. Ou seja, as estatinas causam doenças do coração”. Ele cita o cardiologista texano Peter Langsjoen, autor do estudo Estatinas podem causar problemas cardíacos, apresentado aos órgãos de saúde norte-americanos em 2002, em que advertia para o bloqueio, pelas estatinas, da produção da coenzima Q10 ou Ubiquinona, molécula que previne as doenças cardíacas. Em 2010, a FDA (Food and Drug Administration) finalmente advertiu para os riscos cardiovasculares com o uso de sinvastatina (Zocor, da Merck). É a estatina mais vendida no Brasil.
Veja aqui o vídeo com Raymond Francis.
No site spacedoc, médicos norte-americanos anti-estatinas listam uma série de efeitos colaterais causados pelo medicamento: danos musculares, amnésia, diabetes, disfunção erétil, pancreatite, insônia, câncer, perda de energia… (leia os artigos aqui). Autor do livro 29 Bilhões de Razões Para Mentir Sobre o Colesterol, o britânico Justin Smith produziu um documentário e está preparando outro sobre os interesses financeiros por trás das estatinas, que, afirma, têm seus benefícios exagerados pela medicina tradicional. Entrevistei Smith por e-mail.
Socialista Morena – O que há de errado com as estatinas?
Justin Smith – Há muitos questionamentos. Primeiramente, temos que perguntar se a droga realmente beneficia as pessoas diante dos efeitos colaterais que acarreta. É preciso separar dois tipos de pessoas: as que foram diagnosticadas com um problema no coração e aquelas que não o foram. Para quem não foi diagnosticado como cardíaco, não há nenhum benefício em tomar estatinas, mas estas pessoas estarão expostas aos efeitos colaterais do remédio. Em uma estimativa realista, 20% das pessoas sofrem efeitos colaterais significativos. Milhares de pessoas têm relatado consequências muito sérias durante anos e muitas delas sofreram danos permanentes. Para quem foi diagnosticado com problema cardíaco há um argumento para usar estatinas. Mas os benefícios que estas pessoas podem ter não estão relacionados com a redução do colesterol. Este é um tema complicado e muitos médicos ainda estão debatendo os efeitos das estatinas. Para as pessoas com problemas cardíacos, as estatinas podem ser ao mesmo tempo boas e ruins. O lado positivo é que as estatinas podem estabilizar as placas nas artérias, reduzir a coagulação e melhorar o metabolismo do ferro –tudo isso é muito bom. No entanto, pelo lado negativo, as estatinas aumentam a quantidade de placas calcificadas nas artérias e potencialmente enfraquecem o músculo do coração ao bloquear a produção da coenzima Q10. Além disso, há uma ligação muito forte entre os baixos níveis de colesterol e uma vida mais curta. Como você vê, é uma decisão muito difícil para as pessoas diagnosticadas com problemas cardíacos tomarem.
SM – Alguns médicos me disseram que as estatinas não previnem ataques cardíacos. É isso mesmo?
JS – Há evidências de que as estatinas podem prevenir um segundo ou terceiro ataque cardíaco para quem já teve um infarto. Mas, para a população em geral, as estatinas têm um impacto muito pequeno contra os riscos de ataques do coração, possivelmente nenhum. Por outro lado, as estatinas têm sido associadas com mais de 300 efeitos adversos, em parte pelo fato de o colesterol ser uma substância extremamente importante para o corpo humano e a deficiência de colesterol ter enormes efeitos negativos para a saúde. As áreas mais afetadas são os músculos, o cérebro e o sistema nervoso e os olhos. Em alguns estudos, as estatinas foram associadas a um dramático crescimento no risco de câncer.
SM – Na época em que você lançou seu livro, falou em uma movimentação de 29 bilhões de dólares anuais com as estatinas. Quanto dinheiro elas estão rendendo à indústria farmacêutica atualmente?
JS – É muito difícil dizer, porque a maior parte delas teve a patente quebrada. No entanto, se olharmos para o mercado mais amplo das drogas redutoras de colesterol, há novos remédios surgindo e é um negócio que continua movimentando dezenas de bilhões de dólares cada ano.
SM  Você foi alvo de alguma ameaça por denunciar as estatinas?
JS – Não.
Vídeo aqui.
Em seu documentário, Statin Nation, Smith faz questão de destacar três pontos que vão em direção contrária ao que é apregoado pela medicina ocidental: as pessoas com colesterol alto tendem a viver mais; as pessoas com doenças no coração têm baixos níveis de colesterol; baixar o colesterol de uma população não reduz os índices de doenças cardíacas. E pergunta: “Será que os fatos sobre os problemas do coração, o colesterol e os remédios contra o colesterol têm sido distorcidos pela indústria farmacêutica para aumentar seus lucros?”
Não duvido. O que posso dizer com toda certeza, como jornalista, é: desconfie de médicos que prescrevem a torto e a direito remédios de uso contínuo cuja eficácia é controversa. Desconfie de reportagens que atribuem à “ciência” ou à “medicina” pesquisas patrocinadas pela indústria farmacêutica. Desconfie de revistas que colocam um medicamento como “milagroso” numa capa sem alertar devidamente para os riscos. Desconfie das estatinas.
UPDATE: saiu esta semana uma advertência oficial de especialistas no Reino Unido aos médicos para não iludirem os pacientes sobre benefícios exagerados das estatinas (leia aqui).

SOBRE O ATENTADO CONTRA A AMIA E A MORTE DO PROMOTOR NISMAN

Do jornal argentino Pagina 12

Rienda corta para los espías argentinos

En su edición de ayer, el diario estadounidense The New York Times publicó una nota sobre el caso Nisman escrita por Horacio Verbitsky. Aquí se reproduce el texto completo.


El 14 de enero el fiscal Alberto Nisman acusó a la presidente Cristina Fernández de Kirchner y a su ministro de Relaciones Exteriores Héctor Timerman de encubrir la denunciada participación de Irán en un ataque terrorista de 1994.
Nisman fue hallado muerto cuatro días después, horas antes de su programada presentación para exponer sobre sus hallazgos ante el Congreso. Los títulos de los diarios en todo el mundo sugirieron que el gobierno tenía alguna responsabilidad en una de esas tragedias, o en ambas. Yo no lo creo.
Antes de que lo encontraran con una bala en la cabeza, Nisman había investigado durante casi una década el peor ataque terrorista en la historia argentina, la voladura del centro comunitario judío de Buenos Aires, que mató a 85 personas en julio de 1994. Su muerte conmovió al país y distrajo la atención de su escrito acusatorio de 290 fojas. La oposición veía la audiencia en el Congreso como un arma contra el gobierno mientras el partido gobernante se preparaba para señalar los puntos más débiles del escrito.
Los medios están filtrando fragmentos de 5.000 horas de grabaciones telefónicas de Inteligencia, en las cuales no se escucha a la presidente ni a su canciller. Además sobran los rumores acerca de si Nisman fue asesinado o se suicidó. La señora Kirchner osciló entre suponer que fue un suicido y sugerir que no lo fue. En un año electoral, aunque ella no puede postularse para un nuevo mandato, estas vacilaciones no favorecen a su partido.
Especulaciones a un lado, es importante cuestionar la exactitud de los cargos contenidos en la denuncia, que señala en dirección a Irán. El documento, que fue publicado on line, es autocontradictorio.
Primero, acusa a Timerman (quien es judío y fue víctima de la dictadura antisemita que secuestró y torturó a su padre) de buscar la anulación de las Alertas Rojas u órdenes de captura de INTERPOL contra los iraníes acusados. Luego cita una grabación en la que un presunto agente iraní denuncia a Timerman con un insulto antisemita, por no anular las alertas rojas.
Nisman fue criticado por el mismo hombre a quien elogiaba, el ex secretario general de INTERPOL, Ronald K. Noble. La acusación repite 96 veces que Kirchner y Timerman trataron de conseguir que INTERPOL levantara las alertas rojas contra los acusados iraníes. Pero Noble, que era el responsable de las alertas rojas, lo negó y dijo que los gobernantes argentinos fueron consistentes en el sentido contrario.
En una entrevista publicada el 18 de enero, Noble declaró que “lo que Nisman dice es falso”. El mismo día Nisman fue hallado muerto.
Es extraño que un fiscal con la experiencia de Nisman haya preparado un documento tan débil para formular tan serios cargos contra la presidente y el canciller. De las 290 fojas del documento, sólo dos dicen qué delitos se habrían cometido, sin mención alguna ni a doctrina ni a jurisprudencia. Por esto mucha gente cree que el documento no fue escrito por un abogado y que Nisman fue engañado y usado.
Es más posible encontrar la clave de esta historia en el gobierno del ex presidente Carlos Menem que en el actual. Menem es de origen sirio y antes de las elecciones presidenciales de 1989 se reunió en Damasco con el presidente Hafez al Assad, que le brindó apoyo financiero. La participación argentina en la Operación Tormenta en el Desierto contra el aliado de Siria, Irak, en 1991, arruinó ese romance. En 1992 fue demolida la embajada de Israel en la Argentina y en 1994 voló la mutual judía.
Documentos secretos desclasificados en 2003 revelaron que el primer ministro israelí Yitzhak Rabin mandó a la Argentina un enviado personal apenas horas después del ataque de 1994 con el propósito de concertar una versión común de los hechos para comunicar a la prensa. En ese momento, Rabin enfrentaba la presión política de los opositores a las conversaciones de paz con los palestinos en Oslo, que por primera vez contaban con la aprobación siria.
Después de reunirse con Menem, el enviado de Rabin acusó por el ataque a Irán. La misma semana, un vocero del Departamento de Estado de Washington fue más allá y excluyó a Siria de la lista de sospechosos.
A Menem también le pareció políticamente conveniente apartar la mirada de Siria e hizo todo lo posible para impedir que se investigara la pista siria, debido a su relación previa con el gobierno de Assad y sus promesas incumplidas de apoyo diplomático y cooperación en tecnología nuclear y misilística.
Hoy Menem está procesado junto con algunos miembros de su gabinete, con el juez y con dos de los fiscales, acusados de obstruir la justicia y encubrir evidencias sobre el atentado de 1994.
La organización que presido, el Centro de Estudios Legales y Sociales, representa a un grupo de víctimas del atentado. En 2005, el entonces presidente Néstor Kirchner reconoció la responsabilidad del Estado por no haber prevenido el atentado ni resolverlo después.
Se firmó un acuerdo en el que el Estado se comprometió a modificar la ley de inteligencia para impedir cualquier interferencia con la justicia. Llevó casi una década que la viuda de Kirchner, que ahora conduce el país, comenzara a cumplir ese compromiso.
En diciembre, la señora de Kirchner pareció actuar sobre la promesa de su difunto marido al descabezar la conducción superior de la Secretaría de Inteligencia en un retrasado intento de limpiar la casa.
La muerte de Nisman puede haber sido un gol en contra; muchos creen que el destituido jefe de operaciones de inteligencia, Antonio Stiuso, alimentó el escrito de Nisman y podría estar involucrado en su muerte.
De acuerdo con la denuncia, el Memorando de Entendimiento que la Argentina e Irán firmaron en enero de 2013 facilitó el encubrimiento, cuyo objetivo secreto era permitir la adquisición de petróleo iraní, algo altamente improbable debido a su alto contenido de azufre, seis veces mayor al que admiten las refinerías argentinas. Pero el propósito explícito del Memorando era permitir que el juez interrogara a los acusados iraníes y que se estableciera una Comisión Internacional de la Verdad, formada por prestigiosos juristas de otros países.
Firmar un memorandum con la ingenua ilusión de que algún día permitiera llevar a los acusados ante un tribunal, como ocurrió con los acusados libios por el avión derribado sobre Lockerbie en 1988, no constituye delito. El gobierno argentino ignora quiénes son los culpables pero quiere permitir que la justicia los descubra.
La muerte de Nisman y la incertidumbre que se prolonga sobre el atentado de 1994 pusieron en evidencia las fallas del sistema judicial argentino y su relación promiscua con los servicios de inteligencia.
Las prometidas reformas no pueden postergarse. La Argentina necesita más transparencia, más control sobre los servicios de Inteligencia y la interrupción de los lazos inapropiados entre espías, jueces y fiscales.
La señora de Kirchner anunció esta semana la disolución de la Secretaría de Inteligencia y la creación de una Agencia Federal de Inteligencia. Este es sólo el primer paso para conseguir justicia para las víctimas del atentado de 1994 y la familia de Nisman.

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

LUCRO MONETÁRIO PARECE QUE NÃO VAI HAVER PARA YOUSSEF

Em todo caso, como esse senhor já foi beneficiado antes por delação premiada e voltou a delinquir, o tal acordo continua não cheirando bem. Abaixo, desmentido do MPF quanto à forma de recompensa ao doleiro. Jornal GGN

MPF afirma que Youssef não lucrará com delação premiada

 
Jornal GGN - O Ministério Público Federal contestou as reportagens publicadas na última sexta-feira (24), pelo Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo, que informavam que o doleiro Alberto Youssef poderia lucrar com o acordo de delação premiada.
 
As reportagens indicavam que o acordo do doleiro é o único entre os nove assinados na Operação Lava Jato que prevê, em cláusula, uma taxa de sucesso ou performance. Com a tese, Youssef poderia adquirir 2% sobre os valores recuperados sobre os recursos desviados de contratatos da Petrobras. Se ajudasse a recuperar R$ 500 milhões, por exemplo, teria um retorno de R$ 10 milhões.
 
Entretanto, o MPF esclareceu: "no acordo de colaboração premiada, celebrado pelo Ministério Público Federal e homologado pelo Supremo Tribunal Federal, não existe qualquer cláusula de pagamento pela União de recompensa para o acusado Alberto Youssef".
 
Ao contrário, o MPF lembra, ainda, que o doleiro perderá todos "os seus bens e valores adquiridos após o ano de 2003, que são estimados em mais de R$ 50 milhões", a título de ressarcimento e multa compensatória. 
 
Os 2% entendidos como lucros pelos jornais são, na verdade, o abatimento do valor da multa em 2% do que Youssef poderá localizar de recursos desviados, com exclusividade, ou seja, se somente ele colaborar para isso. E o valor tem restrição. Limita-se ao proporcional de um de seus imóveis.
 
Esse valor será abatido do valor do imóvel e não retornaria a Youssef, mas entregue às suas filhas. Ainda dentro de outras restrições, se houver a descoberta de novos bens ou valores que foram sonegados pelo doleiro, o acordo pode ser rompido.
 
"Os valores mencionados em ambas as reportagens, portanto, além de inconsistentes entre si, não possuem qualquer fundamento nas cláusulas do acordo de colaboração", informou o MPF. 
 
"Esse tipo de acordo é absolutamente legal, pois não se trata de ‘recompensa’, mas de determinação futura do valor da multa a ser paga, e atende o interesse público na busca do ressarcimento máximo do patrimônio do povo brasileiro", completou o órgão, que criticou a omissão desses "aspectos relevantes" nas reportagens.

A OPERAÇÃO LAVA JATO É COISA SÉRIA?

Comentário de Paulo Moreira Leite, no Brasil 247

domingo, 25 de janeiro de 2015

A FALTA DE ENERGIA NA MÍDIA

Uma resenha, por Eduardo Guimarães, no Blog da Cidadania

Desde 2009, mídia já anunciou racionamento de energia 8 vezes

apagão capa

Em novembro de 2009, às vésperas do ano eleitoral de 2010, teve início esforço anual dos maiores órgãos de imprensa do país – que, desde 2003, fazem oposição cerrada aos sucessivos governos federais do PT – para vender à população que o país estaria à beira de racionamento de energia como o que ocorreu ao fim do segundo governo Fernando Henrique Cardoso.
O único apagão real que ocorreu no país, porém, ocorreu entre 1 de julho de 2001 e 27 de setembro de 2002, tendo sido causado por falta de planejamento e investimentos em geração de energia.
Desde então, o Brasil sofreu alguns blecautes episódicos, com duração de poucas horas. Nada que possa ser comparado aos quase 14 meses de racionamento de energia impostos pela falta de planejamento do governo federal tucano (1995 – 2002).
Entre julho de 2001 e setembro de 2002, o limite de consumo mensal de energia elétrica de uma residência, para não ter multa, não podia ultrapassar 320 kWh. Pelas regras do racionamento tucano, se esse limite fosse ultrapassado o consumidor teria que pagar 50% a mais sobre o que ultrapassasse o limite oficial. Além disso, em agosto de 2001, a tarifa da energia elétrica sofreu reajuste de 16%.
Confira, abaixo, quais foram os 13 blecautes episódicos de energia que o país sofreu desde o penúltimo ano do governo Lula até a última segunda-feira, quando vários Estados ficaram sem luz por cerca de 45 minutos devido a desligamento preventivo do fornecimento determinado pelo Operador Nacional do Sistema (ONS).
1 – Houve em 22 de janeiro de 2005, um grande blecaute atingiu os estados do Rio de Janeiro e do Espírito Santo por algumas horas, afetando 3 milhões de pessoas. Porém, não houve praticamente nenhuma repercussão.
2 – Em 7 de setembro de 2007, novamente os dois estados foram atingidos por desligamento de energia causado por problemas em Furnas. Mais uma vez, porém, a repercussão foi praticamente inexistente.
3 – Em 10 de novembro de 2009, devido a desligamento preventivo da usina hidroelétrica de Itaipu Binacional, 18 estados brasileiros ficaram total ou parcialmente sem energia, sendo a região sudeste a mais afetada.
Começava, então, uma prática midiática que se repetiria todo ano. Toda vez que houvesse um blecaute, a mídia diria que o país estava à beira de um novo racionamento.
Uma semana depois, a oposição conseguiu aprovar “convite” ao então ministro das Minas e Energia, Edison Lobão, e à então ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para prestarem esclarecimentos ao Senado sobre o blecaute de uma semana antes.
A grande mídia, para variar, foi atrás da oposição e começou com a história de que haveria risco de o país sofrer novo racionamento, nos moldes do que ocorreu no governo FHC. Coube à então colunista da Folha Eliane Cantanhêde tentar vender a teoria da oposição.
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Os “avisos” de novo racionamento pela mídia foram tão persistentes que contaminaram o debate eleitoral. José Serra, adversário de Dilma na disputa pela presidência, usou a “previsão” feita pela mídia de “racionamento” para tentar convencer a população de que esse racionamento seria iminente.
4 – Em 04 de fevereiro de 2011, quase toda a região Nordeste do País ficou às escuras a partir das 23h30 (horário local) – 0h30 (horário de Brasília), após um problema em linhas de transmissão locais. O blecaute atingiu pelo menos sete estados: Alagoas, Sergipe, Pernambuco, Paraíba, Bahia, Ceará e Rio Grande do Norte.
Mais uma vez, a mídia desandou a fazer previsões de que mais um blecaute episódico, que demoraria um ano e sete meses para se repetir, indicava que o país estaria à beira de racionamento. Outro colunista da Folha tratou de tentar vender a tese, junto às manchetes dos jornais e reportagens dos telejornais.
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5 – Em 3 e 4 de Outubro de 2012, novo blecaute registrado por falha em transformador de Itaipu afetou cinco Estados. O blecaute atingiu áreas do Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Acre, Rondônia e parte do Centro-Oeste. O blecaute do dia 3 durou cerca de 30 minutos e o do dia 4 durou 2 horas. Mais uma vez, a mídia tentou vender a teoria de que o país estaria à beira de novo racionamento, igual ao de FHC.
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6 – Em 25 de Outubro de 2012, devido ao incêndio em um equipamento, 9 estados da Região Nordeste e parte da Região Norte ficou sem energia durante 3 horas. Mais uma vez, a mídia tratou de fazer estardalhaço a anunciar que logo haveria racionamento.
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7 – Em 15 de dezembro de 2012, um blecaute atingiu municípios de ao menos seis estados. O blecaute foi causado por um problema na hidrelétrica de Itumbiara, em Goiás, de propriedade de Furnas. Cerca de dez dias depois (07/01/2013), a Folha de São Paulo anunciou que o governo já tinha decidido fazer racionamento, o que jamais ocorreu.
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9 – Em 28 de Agosto de 2013, um blecaute de energia elétrica atingiu áreas no Nordeste do país por duas horas. Houve falta de energia em Salvador (BA), Fortaleza (CE), Recife (PE), João Pessoa (PB) e Natal (RN). Mais uma vez, explodiram as previsões de que o país estaria às portas de racionamento de energia.
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9 – Em 4 de Fevereiro de 2014, cerca de 6 milhões de consumidores foram afetados pela falta de energia nos estados do Sudeste, Centro-Oeste e Sul, segundo cálculo do diretor do ONS. O blecaute que atingiu ao menos 11 estados do país teve origem em um curto-circuito numa linha de transmissão no estado de Tocantins. O problema durou cerca de 40 minutos. Porém, novamente a mídia tratou de anunciar racionamento iminente.
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10 – Em 11 de Fevereiro de 2014 às 20h20, mais de 40 cidades ficaram às escuras no ES por alguns minutos, incluindo a capital Vitória, devido a uma falha em uma subestação de Furnas. Nos dias que se seguiriam, houve uma avalanche de matérias na mídia dizendo que o racionamento iria começar nos próximos meses. O jornal O Globo chegou a dizer que o governo admitira “risco de racionamento.
11 – Em 19 de Janeiro de 2015 às 14h55, um blecaute atingiu parte de 10 estados (SP,RJ, ES, PR, SC, RS, GO,MG, MS, RO) e o DF causando falta de energia elétrica a mais de 3 milhões de unidades consumidoras. As causas, segundo as concessionárias de energia, foi uma ordem do ONS para que as mesmas reduzissem a carga devido a um pico de energia que ultrapassou a capacidade de produção do país. Por volta das 15h45 a situação começou a ser normalizada.
A partir do último dia 19, a tese de racionamento iminente não saiu mais do noticiário. Não se fala mais em outra coisa. Nesta sexta-feira, a Folha de São Paulo repete O Globo em fevereiro de 2014 e interpreta levianamente declaração do ministro das Minas e Energia, Eduardo Braga, de que poderia haver racionamento se os reservatórios do país inteiro baixarem a um nível catastrófico que nunca foi alcançado e que dificilmente ocorreria.
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O que este post mostra?
1 – blecautes ocorrem episodicamente em um país continental em que as linhas de transmissão, interligadas completamente a partir só do governo Lula, percorrem milhares de quilômetros.
2 – A possibilidade de todos os reservatórios do país se esgotarem de Norte a Sul, é muito pequena. O problema mais grave está restrito ao Sudeste.
3 – À diferença do que ocorreu em 2001/2002, hoje o país tem várias usinas hidrelétricas em fase de construção, tais como Belo Monte, no Rio Xingu, São Luiz dos Tapajós, no Rio Tapajós, Jirau e Santo Antônio, no Rio Madeira, e a Usina de Jatobá, também no Rio Tapajós.
4 – O país vive hoje cenário diferente de 2001/2002 também devido à criação da Empresa de Planejamento Energético, em 2004, no primeiro governo Lula. Coube à EPE planejar a interligação TOTAL das linhas de transmissão em todo o país (já concluída) e a construção de todas essas novas hidrelétricas, sem falar na construção de usinas eólicas e de energia solar.
Não haverá, pois, racionamento de energia no país. O governo nega, especialistas independentes negam. Até porque, além de todas essas iniciativas existem as termelétricas, que podem ser acionadas a carga total em caso de necessidade extrema.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

NA INDONÉSIA, MATANÇA NÃO É NOVIDADE

Do jornal GGN

As mãos de sangue de Suharto e a pena de morte na Indonésia, por Laurez Cerqueira

As mãos de sangue de Suharto e a pena de morte na Indonésia
(*) Laurez Cerqueira
Para ajudar a entender o desprezo do governo da Indonésia pelos direitos humanos, ao executar o traficante brasileiro, Marco Archer Cardoso Moreira, vale a pena visitar um trecho da história recente daquele país, feita de sangue, suor e lágrimas.
Ainda estão vivas as marcas deixadas por um dos mais bárbaros ditadores de todos os tempos, Hadji Mohamed Suharto, entre elas a pena de morte, banalizada desde a “Guerra fria”.
O general Suharto fechou eternamente os olhos no dia 27 de janeiro de 2008, em Jacarta, e deixou para a história o assassinato em massa de cerca de um milhão de pessoas, coberto por um manto de silêncio.
Velado por uma multidão, incensado por admiradores, afagado com condolências de chefes de Estado das grandes potências ocidentais, Suharto foi enterrado com honras militares, como estadista.
Este fato foi tratado pela imprensa como outro qualquer e misturado no turbilhão do noticiário que desaparece todos os dias no túnel do tempo.
O Jornal Nacional, por exemplo, em sua manchete, não o tratou como ditador, mas como líder, na voz grave e aveludada do apresentador William Boner: “ex-líder indonésio, Suharto, morre aos 86 anos em Jacarta”.
Líder de quem?
O jornalista e documentarista australiano, John Pilger, um dos mais premiados jornalistas investigativos do mundo, esmiuçou a ditadura de Suharto, levantou um volume extraordinário de informações ao longo de sua vida, publicou em jornais, livros, documentários, revelou para o mundo o submundo de um dos regimes mais cruéis da história da humanidade, que deixou cicatrizes profundas na vida do povo indonésio.
Alguns órgãos de imprensa, acanhadamente, falam em 500 mil pessoas, mas Pilger afirma que o número de execuções do regime de Suaharto é muito maior, chega a um milhão.
É considerado o segundo maior massacre da segunda metade do século XX. Perde apenas para o ditador haitiano “Papa doc”, outro facínora apoiado pelos EUA.
Só no Timor Leste, sob domínio indonésio, foram mortas 200 mil pessoas, em 1975, segundo Pilger.
Além disso, Suharto lidera a lista dos ditadores mais corruptos de que se tem notícia.
Depois de 30 anos no poder, o ditador acumulou uma fortuna avaliada em 15 bilhões de dólares, o equivalente a 13% da dívida externa do país, da qual o Banco Mundial, em grande parte, é credor.
A família Shuarto controla pedágios, bancos, rede hoteleira, extensões de florestas, rede de imobiliárias, shopping-centers, revendedoras de automóveis e empresas de muitos outros ramos de atividade.
Uma ditadura para proteger negócios
A história da ditadura de Suharto começou por volta de 1965/66, quando comandou as tropas que derrubaram o presidente nacionalista Achmed Sukarno, no governo desde o fim da colonização holandesa.
Em 1967, logo depois do golpe, em plena "Guerra Fria", o grupo Time-Life Corporation promoveu em Genebra uma conferência, realizada em três dias, na qual foi discutida a partilha corporativa da Indonésia.
Suharto dividiu a mesa dos trabalhos da conferência com os representantes dos maiores grupos capitalistas do mundo, gigantes dos negócios do Ocidente, como David Rockefeller e outros do mesmo porte.
Mandaram representantes, os principais bancos, empresas petrolíferas, montadoras de automóveis, indústria química, de comunicação, de papel e outras.
O grupo Time-Life Corporation, que promoveu essa conferência, é o mesmo que injetou na Rede Globo, em 1962, US$ 6 milhões de dólares a fim de estruturar a TV e outros veículos de comunicação da família Marinho, segundo o livro "A História Secreta da Rede Globo", do jornalista Daniel Hertz.
Grande parte dos técnicos indonésios, que acompanhavam Suharto na conferência havia chegado de uma jornada de estudos nas universidades da Califórnia e Berkeley e estavam ali para apresentar as informações sobre os principais atrativos do país: mão-de-obra abundante e barata, recursos naturais à vontade e um mercado potencial inestimável.
Na reunião foram discutidas as linhas gerais do que seria uma economia de mercado e os técnicos se encarregaram de detalhar as medidas a serem adotadas.
A Fundação Ford bancou o plano através do Centro de Estudos Internacionais e do Instituto de Pesquisas Stanford.
O economista Dave Coler, da Universidade de Harvard, foi encarregado de chefiar a equipe e redigir o plano em detalhes.
Coler havia concluído a reforma bancária na Coréia do Sul para adaptar o sistema financeiro daquele país ao mercado financeiro internacional. O mesmo foi feito na Indonésia.
A Indonésia repartida
A Indonésia foi repartida em cinco setores: mineração, serviços, indústria leve, finanças e sistema bancário.
Assim as empresas montaram a infraestrutura dos negócios e estabeleceram as condições para entrada no país.
A Freeport Company ficou com o cobre de Papua Ocidental (Henry Kissinger, até recentemente fez parte do conselho diretor da Freeport); um consórcio americano e europeu ficou com o níquel; a Alcoa ficou com a maior parte da bauxita; um grupo de empresas americanas, japonesas e francesas ficou com as florestas tropicais de Sumatra, Papua Ocidental e Kalimantan.
A Cargil, que hoje domina o comércio mundial de alimentos, ficou com as regiões de terras mais férteis, para o agronegócio.
Suharto baixou um decreto isentando os grupos estrangeiros de impostos por cinco anos e criou o Intergovernamental Group on Indonésia (IGGI), formado por representantes dos Estados Unidos, do Canadá, da Europa e da Austrália, mais o FMI e o Banco Mundial, para gerir a economia do país.
A partir de 1967 a Indonésia foi inundada de dólares. O Banco Mundial, em seus relatórios, referia-se ao governo de Suharto como "O menino-modelo da globalização" e do "Milagre da Ásia Ocidental".
Entre os anos 1960 e 1990, os chamados "Tigres asiáticos" (Indonésia, Coréia do Sul, Taiwan ou Formosa, Cingapura, Tailândia, Malásia e Hong-Kong), eram considerados modelo de desenvolvimento.
Seguiam religiosamente as regras impostas pelas agências internacionais, cresciam vertiginosamente à custa do capital estrangeiro, de recursos naturais e de mão-de-obra barata da região.
Margareth Tacher, em meados dos anos 80, chegou a dizer à imprensa: "Suharto é um de nossos melhores e mais valiosos amigos".
Um dos maiores massacres da segunda metade do Século XX
O golpe militar, iniciado em 1965, levou a Indonésia a um banho de sangue. Depois da conferência, Suharto se convenceu de que era necessário liquidar toda a oposição que ainda restava no país.
Assinou vários acordos de cooperação militar e de segurança, principalmente com os EUA e com a Inglaterra.
Foi deslocado para a Indonésia o maior contingente de agentes da CIA e de instrutores para treinamento das forças armadas e da repressão policial de que se tem notícia.
O país foi transformado no maior laboratório da CIA de repressão política no CIA no mundo.
Essa operação, denominada “operação modelo”, pelos agentes da CIA serviu de experiência para a “Operação Fênix”, no Vietnã, onde esquadrões da morte mataram cerca de 50 mil pessoas, e para preparar grupos para atuar em outros países, muitos deles na América Latina.
Essa escolha da Indonésia para ser um laboratório de repressão política não foi à toa. Entre 1959 a 1965, mais de 15 milhões de pessoas filiaram-se a partidos políticos ou organização de massa no país, estimuladas a desafiar a influência britânica e norte-americana na região.
Segundo o historiador australiano, Harold Crouch, o PKI - Partido Comunista da Indonésia, era o maior partido comunista do mundo fora da URSS e da China, com mais de três milhões de filiados.
Um partido que não dispunha de organização suficiente para uma insurreição armada, se restringia à defesa dos interesses dos pobres dentro do sistema vigente. Crescia, aceleradamente, mais que qualquer outro, e se popularizava com as grandes manifestações de massa.
Aos olhos da CIA e de Suharto, o crescimento do PKI representava um perigo para a região. No vizinho Vietnã a situação não era boa para os Estados Unidos e aliados.
Entre 1965 e 1966, de posse da lista de filiados e ativistas, Suharto, com a colaboração da CIA e do serviço secreto britânico, segundo a jornalista americana, Kathy Kadane, dividiu a Indonésia em regiões de maior concentração de membros do partido comunista e deu início à perseguição numa chamada “operação limpeza”.
Milhares de pessoas foram retiradas de suas casas e executadas em plena luz do dia.
Kadane escreve que os agentes da CIA que acompanhavam os militares na operação iam riscando os nomes das listas, à medida que as pessoas iam sendo executadas.
Os relatos das torturas e execuções são inimagináveis, tal a brutalidade dos militares de Shuarto.
Pessoas eram sequestradas e decapitadas, as cabeças apareciam sob muros nas ruas de Jacarta ou de outras cidades.
As matanças foram mais monstruosas em Bali. A escritora inglesa Carmel Budiardjo, ex-presa política, conta que na ilha de Bali foram executadas 80 mil pessoas.
As pessoas eram dominadas, as mãos amarradas e executadas. Nas aldeias indonésias, jovens foram trucidados, os pênis arrancados e alinhavados em fileiras para depois contar os mortos.
Testemunhas relataram ter visto rios com incontáveis corpos boiando sobre as águas, como toras.
Os métodos de tortura adotados nos interrogatórios eram os mesmos utilizados no Vietnã, no Cambodja, na Coréia, no Chile, na Argentina, no Brasil e noutros países.
A ilha de Buru durante muitos anos recebeu milhares de prisioneiros sem alojamento, alimento ou água. Lá morriam.
Haru Atmojo, um ex-oficial da aeronáutica, leal a Sukarno, julgado por um tribunal militar especial e condenado à prisão perpétua, hoje vive em Jacarta e conta que passou quinze anos na prisão, em grande parte numa solitária.
A primeira cela, nas montanhas geladas de Bandung, conta ele, era tão pequena que não conseguia sequer se deitar. Uma forma de tortura que matava lentamente.
Essa prisão foi construída pelos holandeses na época da colonização para encarcerar pessoas pelo prazo de doze dias, antes dos interrogatórios.
Atmojo amargou 15 anos nessa prisão e sobreviveu para contar esta e outras histórias terror na Indonésia.
Agentes da CIA, que recusaram se identificar para imprensa, na época, revelaram que os métodos utilizados nos interrogatórios e na repressão política foram pesquisados em relatos de livros do período da inquisição. Segundo eles, os métodos do Santo Ofício eram muito eficientes e estavam sendo testados na “operação modelo” com muito sucesso.
Robert J. Martens, ex-adido político da embaixada americana em Jacarta e Joseph Lazarsky, subchefe do escritório da CIA também em Jacarta, confirmaram à imprensa que eles passaram ao exército de Suaharto uma lista de 5 mil pessoas, consideradas as mais importantes cabeças do PKI, para serem executadas.
Muitas delas queriam vivas para serem interrogadas, mas ao resistir à prisão e foram fuziladas. Outras morreram nos interrogatórios. Os agentes da CIA se queixaram de que no início das operações Suaharto não dispunha de esquadrões de matadores e inquisidores suficientes para eliminar e interrogar todas as pessoas da lista. Tiveram que preparar os esquadrões.
A CIA, no início, avaliou o exército de Suharto e o considerou precário para as operações planejadas. Sugeriu a Washington, em relatório, investir em equipamentos. O pedido foi atendido prontamente.
Uma rede completa de comunicação foi levada em voos noturnos a Jacarta, por aviões da força aérea americana baseada nas Filipinas.
Os equipamentos eram de última geração com frequências altas, conhecidas da CIA e da Agência de Segurança Nacional que assessorava o ex-presidente Lyndon Johnson.
A indústria de armas, naquela época, crescia a níveis inimagináveis. As ditaduras se espalhavam pelo mundo como erva daninha e os acordos de cooperação militar proliferavam nos moldes da doutrina de segurança nacional.
Além da Indonésia, Índia, Paquistão, Iraque, Israel e outros, são exemplos de países que foram às compras no mercado de armas. Estados Unidos e Inglaterra lideravam a venda.
Na década de 80, no governo de Margareth Tatcher, quase metade das verbas destinadas à pesquisa e desenvolvimento foram destinadas à pasta da defesa.
Naquela época, a Indonésia foi beneficiada por um empréstimo subsidiado pelo governo britânico, quase uma doação, de 1 bilhão de libras esterlinas para compra de caças-bombardeiros.
O serviço secreto britânico já dispunha de informações suficientes para sugerir à Primeira-Ministra algo do gênero, tendo em vista os negócios britânicos na região.
O mundo girou, o tempo passou e a crise chegou.
Na segunda metade dos anos 1990 a crise chegou aos “Tigres asiáticos” de forma devastadora. Os “Tigres asiáticos” se transformaram em “tigres de papel”.
As economias que eram centradas no direcionamento da indústria para exportação de bens de consumo, em altos investimentos externos e no aproveitamento de mão-de-obra barata e qualificada, começaram a dar sinais de esgotamento no início dos anos 1990, com o declínio das exportações, aumento do déficit público e maior dependência de empréstimos estrangeiros.
Essa necessidade de financiamento externo tornou os “Tigres asiáticos” presas fáceis dos ataques especulativos, que começaram a ocorrer em julho de 1997 e tiveram seu ápice em meados de 1998.
As bolsas despencaram na região e as economias daqueles países foram à bancarrota. Naquela época a grande gambiarra eletrônica e financeira internacional movimentava mais de US$ 2 trilhões  por dia. Hoje supera US$ trilhões.
Em essência, esse mercado é responsável pela captação da poupança da sociedade para aplicá-la nos negócios mais lucrativos, realizam lucros espetaculares e migram para outras praças.
A crise tinha como epicentro as economias do Japão e da Federação Russa. No final de 1997, a quarta maior instituição financeira do Japão, a Yamaichi Securitis, decretou falência.
As autoridades monetárias japonesas revelaram naquele momento que as instituições financeiras do país totalizavam mais de US$ 580 bilhões em títulos podres, de difícil recebimento. O sistema financeiro japonês entrou em colapso.
Os bancos pararam de emprestar dinheiro, levando à falência inúmeras empresas. Para compensar as perdas causadas pela inadimplência, os bancos japoneses resolveram retirar dinheiro de outros mercados, principalmente dos “Tigres asiáticos”.
Suharto não servia mais aos negócios do Ocidente. O país estava com uma dívida de US$ 262 bilhões, valor correspondente a 170% do PIB do país.
O Tribunal de Contas do governo dos Estados Unidos examinou a situação financeira da Indonésia e constatou que o Banco Mundial havia perdido US$ 10 bilhões naquele país.
O Tribunal informou ao Senado detalhes sobre propinas, desvios e fraudes, que o Banco ignorara nos relatórios internos, para não contrariar a família Suharto e seus amigos.
Os relatórios indicavam que pelo menos 30% dos empréstimos do Banco estavam sendo desviados para funcionários e políticos do Governo da Indonésia.
Uma onda de protestos, puxada pelos estudantes, contra o governo e a intervenção do Banco Mundial e FMI, tomou as ruas de Jacarta e de outras cidades.
Nos confrontos os militares levaram para as ruas os veículos blindados britânicos antimotim, mas já era tarde. Shuarto não resistiu aos protestos e caiu em junho de 1998, deixando em seu lugar Jusuf Habibie, um de seus delfins, que continuou com a linha dura na política.
A Indonésia é hoje um dos países de maior desigualdade no mundo, com mais de 70 milhões de pessoas pobres, condenadas a pagar as dívidas contraídas pelo ditador.
A agricultura familiar deu lugar ao agronegócio, milhões de famílias foram expulsas das terras, numa verdadeira diáspora, e se amontoaram nas periferias das grandes cidades, em condições subumanas, vivendo em favelas, com esgotos a céu aberto, condenadas ao mercado de trabalho informal ou, quando na indústria, ganhando salários que mal dá para a ração de subsistência.
A agricultura autosustentada foi varrida do mapa, dando lugar ao sistema diarista, concebido pelo Banco Mundial, como “solução” para a multidão que perdeu suas terras.
Enfim, esse é um breve resumo da história de um dos maiores massacres da segunda metade do século XX, de entrega de um país aos grandes negócios, de condenação de uma enorme população à pobreza e à violência.
Suharto cerrou os olhos, definitivamente, sem nunca ter sido julgado por um tribunal. Certa imprensa brasileira olhou de soslaio o ditador em seu leito de morte e o chamou de “Líder”, talvez pelos serviços prestados ao Ocidente.
Se ele tivesse sido um governante anti-Ocidente, seguramente seria chamado de ditador, seu currículo de atrocidades teria sido divulgado com estardalhaço.
Como o mundo dá muitas voltas, na cobertura da execução do brasileiro Marco Archer, repórteres da TV Globo tiveram seus passaportes confiscados pelo governo indonésio.
Certamente a Globo faria imagens do brasileiro para explorá-las à exaustão, como sempre faz, e com isso ganhar mais dinheiro. Não devia estar interessada em mostrar a barbárie estabelecida na Indonésia, onde a banalização da pena de morte é apenas um detalhe de toda a violência no país.
Quanto ao que representou Shuarto para os EUA, Inglaterra e outros países do ocidente, o governo dele pode ser resumido no que disse, em tempos idos, Franklin Roosevelt, sobre o ditador dominicano, Rafael Trujilo: “Ele pode ser um filho da puta, mas é nosso filho da puta”.
(*) Laurez Cerqueira é autor, entre outros trabalhos, de Florestan Fernandes – vida e obra; e O Outro Lado do Real.