terça-feira, 14 de maio de 2013

SEGREDOS E PODER



No período em que fiz parte do PT, em uma das últimas campanhas de eleição, em determinada reunião plenária dos grupos que elaboravam propostas setoriais, fiz uma de minhas poucas e “desastradas” intervenções. Como coordenador do grupo de trabalho de energia, em meu nome, admiti que a cúpula do partido fizesse acordos com outras forças – partidos e atores econômicos, mas que o fizessem dentro de parâmetros e limites que fossem debatidos naquela assembleia, para que nossas propostas de governo fossem a sério.


Não devo ter dito isso nesses exatos termos, mas de fato contestei a legitimidade de acordos que permaneceriam secretos e que sentia, poderiam invalidar ou pelo menos mutilar muitas das propostas que iam sendo elaboradas para ser apresentadas ao eleitorado. Eu não participava de nenhuma cúpula, e tinha ojeriza aos grupos em que o PT estava dividido, incluído aí o grupo que se tornou dominante, o de Lula e José Dirceu.


Essa intervenção foi recebida com quase unânime hostilidade pelos participantes (só depois da reunião um ou dois militantes se aproximaram para se solidarizar com minha fala). Mais tarde, fui observando as prevaricações aparentes do governo de Marta Suplicy na cidade de São Paulo: o fato de não constituir a prefeitura como parte lesada em uma investigação em outro país, a Suíça ou os Estados Unidos, sobre dinheiro na posse de Paulo Maluf, o fato de se ter construído uma selva de pedra em meu bairro – Cidade São Francisco, sem dar uma contrapartida por ser grande gerador de tráfego, como exigia a lei. E a famosa carta aos brasileiros de Lula com candidato em 2001, que ao mesmo tempo em que procurava se legitimar perante o poder financeiro nacional e internacional legitimou as ações lesivas ao país do governo Fernando Henrique Cardoso.


Eu sabia que corriam negociações por cima de todos nós, fossemos petistas ou não. Não era o que queríamos, depois da ditadura. Ignorava que a cleptocracia brasileira não seria combatida de fato, nem interrompida com os governos de Lula e Dilma. Notem bem, não estou dizendo que eles introduziram ou pioraram a corrupção. Isto é a mentira que a direita quer pregar para voltar ao poder pleno e radicalizar nas desnacionalizações, privatizações e ações assemelhadas. Estou tratando de levantar, isso sim, a questão das formas de poder que são exercidas fora das vistas dos meros cidadãos. Estou sendo claro?


A maior parte da esquerda não reagiu, porque apesar dessas mudanças de postura no poder ainda considerava os seus políticos como parte dela que estariam fazendo concessões táticas enquanto retinham a visão estratégica de projeto de Brasil para médio e longo prazo. Assim como aconteceu em países da Europa como França e Espanha. Assim, a esquerda pouco cobrou dos novos governantes, que de todo modo fizeram avanços importantes que já citei mais vezes neste blog, e que não deveriam ser revertidos.


A questão aqui é que os acordos secretos, descendentes diretos dos conchavos da política estudantil e dos conchavos de sindicatos com os patrões, privam os trabalhadores e os cidadãos comuns da possibilidade de ter algum controle sobre seus líderes eleitos. Ao mesmo tempo, eles são a ferramenta básica das formas superiores de corrupção. Superiores no sentido de afetarem e, escala maior tanto as finanças como a direção estratégica da economia.


Os conchavos das elites dominantes são antigos como o Brasil, desde seu início como colônia, assim como a ocultação das forças por trás das ações dos governos. Nunca o Brasil foi vendido abertamente, embora uma economista ex-libelu tenha louvado a farra privatista e desnacionalizante do governo Fernando Henrique Cardoso exatamente nesses termos e em público , provocando a fúria pontual de um distraído general.  Mas foi vendido fora do conhecimento dos brasileiros comuns, e as imposições das potências imperiais após a independência sempre foram empurradas para debaixo do tapete.

Corrupção de origem estrangeira sempre foi um fato básico da política brasileira, de Portugal a Inglaterra, Estados Unidos e vários países europeus. Assim como a corrupção doméstica, basicamente mecanismos extra-oficiais  (ilegais) portanto ocultos, de transferência de recursos e riquezas do país para indivíduos e grupos privados.


O IPES e o IBAD, abertamente financiados pelos Estados Unidos na preparação do golpe de 1964, foram apenas a ponta do iceberg. Na história recente do Brasil, a atuação dos agentes da CIA, de tempo integral ou parcial, de nacionalidade estadunidense ou brasileira, dos agentes informais representados pelos dirigentes das grandes empresas estadunidenses aqui instaladas e pelos ideólogos da globalização subordinada instalados nas universidades, e que defendem interesses que quase sempre se chocam com o desenvolvimento da economia e da soberania brasileiras, constitui uma inexistência em nossa mídia e no discurso dos políticos de centro-direita e de centro-esquerda (quase a totalidade).


Essas forças e esses mecanismos de ocultação continuam como sempre. A emergência de novas armas do império, como a vigilância planetária da internet e a expansão mais recente do poderio militar com bases militares convencionais e de drones, mais a multiplicação de ações de alta violência e terrorismo pelo complexo CIA- JSOC,  (comando conjunto de operações especiais na sigla em inglês), e pela DEA (administração do controle legal de drogas na sigla em inglês) não muda a estrutura de poder do poder mundial. Ela conta sempre com as ações do governo dos EUA e de seus agentes no exterior, de tempo integral ou não, pagos ou não, conscientes ou não, em todos os países do mundo: amigos, aliados e inimigos.

Ter conhecimento dos mecanismos ocultos de poder talvez não mude muito a correlação de forças no país. Mas se o público continuar a ignorar ou subvalorizar a importância desses segredos, isso certamente impedirá que a democracia funcione no processo de emancipação dos brasileiros como povo e do Brasil como nação.

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