quinta-feira, 11 de agosto de 2011

O PROCESSO DE PERDA



Na década de 70, Brasília ainda estava na adolescência, não existiam os Para Lamas do Sucesso nem a Legião Urbana. Nessa época, o senador Mem de Sá, que foi ministro do primeiro ditador militar, Castelo Branco, aposentou-se no começo do governo Geisel, voltou ao Rio e escreveu as etapas do relacionamento dos expatriados pela mudança da capital do Brasil com a cidade, descritas em jornais da época, todas começando pela letra D:

• Deslumbramento, nos primeiros tempos depois de mudar-se para lá, ao admirar a concepção e a arquitetura da cidade
• Decepção, ao fim de algumas semanas
• Desespero, ao constatar que é muito pior do que parecia, e não tem como melhorar
• Divórcio, quando a mulher também passou pelas etapas anteriores e decide ir embora para o Rio de Janeiro
• Demência, quando o indivíduo começa a falar bem de Brasília, e em muitos casos é sincero.


Não sei se tinha relação, mas nessa época , como descrito a seguir no verbete da Wikipédia sobre o assunto, já tinha sido lançado o livro de Elisabeth Kübler-Ross em que se descrevem as etapas do processo de perda para as pessoas que as sofrem:
O Modelo de Kübler-Ross propõe uma descrição de cinco estágios discretos pelo qual as pessoas passam ao lidar com a perda, o luto e a tragédia. Segundo esse modelo, pacientes com doenças terminais passam por esses estágios.
O modelo foi proposto por Elisabeth Kübler-Ross em seu livro On Death and Dying, publicado em 1969. Os estágios se popularizaram e são conhecidos como Os Cinco Estágios do Luto (ou da Dor da Morte, ou da Perspectiva da Morte).

Enumeração dos estágios
Os estágios são:
1. Negação e Isolamento: "Isso não pode estar acontecendo."
2. Cólera (Raiva): "Por que eu? Não é justo."
3. Negociação: "Me deixe viver apenas até meus filhos crescerem."
4. Depressão: "Estou tão triste. Por que se preocupar com qualquer coisa?"
5. Aceitação: "Tudo vai acabar bem."
Aplicabilidade
Kübler-Ross originalmente aplicou estes estágios para qualquer forma de perda pessoal catastrófica, desde a morte de um ente querido e até o divórcio. Também alega que estes estágios nem sempre ocorrem nesta ordem, nem são todos experimentados por todos os pacientes, mas afirmou que uma pessoa sempre apresentará pelo menos dois.
Outros notaram que qualquer mudança pessoal significativa pode levar a estes estágios. Por exemplo, advogados criminalistas de defesa experientes estão cientes de que réus que estão enfrentando a possibilidade de punições severas com pouca possibilidade de evitá-las freqüentemente experimentam estes estágios, sendo desejável que atinjam o estágio de aceitação antes de se declararem culpados.
Uma outra descrição disponível na internet:
FONTE: Pat Tollefson, ALPHA-1 NEWS
O impacto psicológico em caso de ser diagnosticado com uma doença pulmonar crônica pode “e o mais provável é que seja assim” calar ou permear toda a nossa vida. A experiência demonstrou-me que os assuntos psicológicos têm que ser atendidos antes de que se possa seguir adiante vivendo o melhor possível com uma doença pulmonar. Aparentemente muitas pessoas entram em negócio ou não entendem que o processo de perda (aflição, pena) é um aspecto normal em ser diagnosticado, tanto com uma doença crônica, como com uma genética.
A maioria das pessoas pensa no processo de perda quando se enfrentam á morte, mas as etapas de perda Kubler Ross também são experimentadas em muitos aspectos da vida; cada vez que nos enfrentamos a uma perda desde um divórcio até uma doença. Reconhecer que é necessário passar por este processo permitir-nos-á experimentar as diferentes etapas que incluem:
• Negação. Tratar de provar que em nós nada anda mal (ignorar os sintomas, esforçar-se mais além das capacidades físicas, seguir fumando).
• Coragem e culpa. Para nós mesmo ou outras pessoas como a parelha, os filhos ou os que cuidam de nós.
• Negociação. Fazemos promessas com a esperança de que tudo vai a estar bem ou ser igual como antes.
• Depressão. Sentimentos de desesperança e impotência.
• Aceitação. Aprender a viver com a doença ou a perda.
É normal experimentar todas estas etapas quando se é diagnosticado com uma doença crônica e não sempre acontecem as etapas na ordem mencionada. Poder-se-ia experimentar um ciclo de adianto e retraso nas diferentes etapas antes de chegar á aceitação. Conheci pessoas que estiveram estancadas numa etapa em particular, com a raiva, vivendo amargadas durante anos. Creio que reconhecendo as diferentes etapas da perda, pode ajudar a uma pessoa a mover-se até chegar á etapa da aceitação.
Ademais das etapas de perda, existe a necessidade de sentir tristeza pelo diagnóstico ou da perda. O ter alguém com quem falar acerca dos nossos sentimentos pode ajudar. As pessoas que cuidam doentes devem ser cuidadosas de não tratar de “ajeitar as coisas” para eles (porque simplesmente não se pode), senão é preferível estar á escuta e estar aí quando nos necessitem. Também existe a necessidade de deixar ir o passado e tomar controle do presente. Pode ser necessário mudar a direção das nossas vidas e alterar nossas metas.
Todos compartimos as seguintes necessidades psicológicas:
• Sentido de pertencer
• Ser necessitados
• Ser reconhecidos
• Poder contribuir
• Sentir-nos seguros
• Ter uma estima própria saudável
• Êxito
• Aceitação de como somos
• Ser elogiados
Pergunte-se a si mesmo que pode fazer para cumprir com estas necessidades. Estabeleça metas realistas e deixe a um lado as que não o são. Trate de identificar o problema, que contribui ao problema, que verdadeiramente deseja que seja o resultado final, e que alternativas estão disponíveis para ajudar-lhe a alcançar o resultado final. Conserve os roles que teve; ser mãe, pai, irmão ou irmã. Normalize a sua doença; a vida não termina por uma doença. Busque um médico com quem se sinta cômodo e confiado e siga as suas indicações sobre o tratamento. Utilize os recursos da comunidade (grupos de apoio) e eduque-se dobre a sua doença. O conhecimento ajuda a diminuir o medo. Pratique técnicas de redução de estresse. Exercite-se. Se fosse necessário, busque ajuda profissional para a depressão, a coragem e a ansiedade.

E ainda, por Luís César Ebraico, na UOL:

Elisabeth Kübler-Ross é um nome para não ser esquecido. Formou-se em medicina na Universidade de Zurique em 1957. Transferiu-se para os Estados Unidos no ano seguinte. Especializou-se em Psiquiatria. No hospital em que passou a trabalhar em Nova Iorque, ficou chocada com o tratamento que era dado aos pacientes terminais. Pouco mais do que dez anos depois escreveu um livro - On Death and Dying ( = Sobre a Morte e sobre o Morrer ). E o que dizia ali?

Por primeiro, dizia que os pacientes terminais eram ABANDONADOS pelos médicos. Sua interpretação de por que isso ocorria? A de que médicos odeiam perceber a própria impotência e que, por isso, fugiam dos pacientes que não podiam salvar.

Por segundo? Dizia que os pacientes que iam certamente morrer AINDA ESTAVAM VIVOS e era totalmente incabível abandoná-los.

Por terceiro? Sentou-se com eles, para ouvi-los. O que ela ouviu e relatou tornou-se um clássico para quem se importa com isso. Um clássico para se entender o luto.

Luto implica perda. Haverá maior perda do que a da própria vida? E o que vão perder, senão a vida, os pacientes terminais? E o que Kübler-Ross aprendeu e ensinou? Que, frente a iminência de perder a vida, passamos por *cinco etapas, das quais quatro, que me parecem as mais relevantes, discutirei aqui: a primeira, negação; a segunda, ódio; a terceira, depressão; a quarta, conciliação.

Segundo a autora - e minha experiência como terapeuta faz-me acordar por completo com ela - defrontados com a possibilidade de perder nossa vida - recebendo, por exemplo, o diagnóstico de sermos portadores do HIV - a maneira menos dolorosa de encarar o terrível impacto produzido por isso implica atravessarmos as seguintes etapas:

Na primeira, negamos, dizendo: "Não, não é verdade! O próximo exame mostrará que houve algum engano!"

Na segunda, nos enfurecemos, dizendo: "Mas por que eu? Aquele canalha do meu vizinho que trai a mulher, rouba o condomínio e não trabalha não pega HIV e eu sim!"

Na terceira, após esbravejar muito, nos deprimimos, dizendo: "Meu deus, não vou mais poder fazer aquele doutorado em Cambridge que era meu sonho! Nem etc., etc., etc.."

Na última, após negar, odiar e deprimir, nos conciliamos. Como é isso? É como nos ensinou Kübler-Ross. Pensamos: "Bem, já que estou aqui e ainda não morri, por que não leio aquele livro que sempre quis ler?" E passamos a aproveitar todos os prazeres que ainda podemos aproveitar.

Imagino que pouquíssimos de meus leitores sejam pacientes terminais. Então por que Kübler-Ross? Porque a clínica psicoterápica demonstra que o padrão que ela descobriu trabalhando com esses pacientes se aplica a TODA E QUALQUER PERDA. Você perdeu uma caneta? Então, provavelmente, primeiro vai não acreditar que perdeu, depois vai ficar enfurecido com isso, depois ficar triste, depois... Bem, se tiver atravessado todo esse processo, acho que vai comprar outra.

Agora se você impedir que tal processo ocorra, em vez de comprar outra caneta, vai ficar chorando o resto da vida pela que perdeu. Ou, então, fazer o papel idiota de dizer que sempre odiou canetas...

* A quinta etapa chama-se 'negociação'

Slavoj Zizek, em seu recente livro Living in the End Times, descreve as questões filosóficas pertinentes à época atual em termos das etapas de Kubler Ross, sem citar a própria. Seus capítulos principais têm os títulos:

Negação: A Utopia Liberal
Raiva: A Atualidade do Teológico-Político
Negociação: O Retorno da Crítica da Economia Política
Depressão: O Trauma Neuronal, ou, A Ascensão do Cogito Proletário
Aceitação: A Causa Recuperada.

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